Endocardite é o nome que damos à inflamação das estruturas internas do coração, principalmente das válvulas cardíacas. Se for causada por um agente infeccioso, chamamos de endocardite infecciosa; se o agente infeccioso for uma bactéria, o nome mais correto é endocardite bacteriana.
A endocardite surge habitualmente quando uma bactéria que está circulando na corrente sanguínea se aloja em uma das válvulas cardíacas, multiplicando-se e formando o que chamamos de vegetação valvar. A vegetação das válvulas é um emaranhado de bactérias, glóbulos brancos, glóbulos vermelhos, fibrinas e restos celulares, que é capaz de destruir a própria válvula e impedir o normal funcionamento do coração.
Neste texto vamos abordar as causas, os sintomas e o tratamento da endocardite infecciosa.
GRAVIDADE DA ENDOCARDITE BACTERIANA
Se não for reconhecida e tratada a tempo, a endocardite infecciosa costuma destruir a válvula cardíaca acometida, levando o paciente a um quadro de insuficiência cardíaca aguda e grave (leia: INSUFICIÊNCIA CARDÍACA – CAUSAS E SINTOMAS). O coração não consegue funcionar adequadamente se uma das suas válvulas encontra-se destruída.
Porém, além da insuficiência cardíaca, que por si só pode levar o paciente ao óbito, a endocardite também pode causar outras graves complicações, tais como:
– AVC, embolia pulmonar ou isquemia dos membros: coágulos de sangue misturados com vegetações podem se desprender da válvula e viajar até os pulmões, cérebro ou qualquer outra região do corpo, causando trombose à distância (leia: EMBOLIA PULMONAR e ENTENDA O AVC – ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL). Esses pedaços de vegetação que se soltam são chamados de êmbolo séptico.
– Glomerulonefrite ou infarto renal: nos rins, além do infarto renal pela embolização da vegetação, a endocardite infecciosa também pode provocar um quadro de glomerulonefrite, que pode evoluir com insuficiência renal aguda e necessidade de hemodiálise.
Portanto, já deu para perceber a potencial gravidade da endocardite, não sendo de se estranhar que essa infecção tenha uma mortalidade próxima de 30% (quase um em cada três pacientes com infecção das válvulas cardíacas evoluem para o óbito).
As endocardites infecciosas causadas pela bactéria Staphylococcus aureus são mais graves e mais agudas, enquanto as endocardites causadas pela família das bactérias Streptococcus e Enterococos são mais subagudas (quadro mais arrastado) e têm taxa de mortalidade menor.
COMO SURGE A ENDOCARDITE?
Nosso sangue é habitualmente estéril, ou seja, não contém germes circulantes. Quando bactérias alcançam a corrente sanguínea, dizemos que o paciente tem uma bacteremia.
A bacteremia é um evento essencial para o surgimento da endocardite. Este é um dos motivos pelo qual não se deve atrasar o tratamento de infecções, sejam elas dentárias, na pele ou em qualquer outro ponto do corpo. Quanto mais tempo uma infecção existir, maior será o risco destes germes alcançarem a circulação sanguínea. Uma vez no sangue, as bactérias podem se deslocar para qualquer ponto do organismo, incluindo as válvulas cardíacas.
A bacteremia é um fator necessário para que ocorra a endocardite. Porém, nem toda bactéria que circula no sangue se aloja no coração. Outros fatores colaboram para o risco de adesão dos agentes infecciosos às válvulas cardíacas. São eles:
a) Administração de drogas intravenosas
Nos hospitais toda administração de substâncias por via intravenosa (IV) é feita seguindo rígidos padrões de higiene, exatamente para evitar que bactérias sejam lançadas diretamente na circulação sanguínea.
Esse cuidado raramente ocorre em usuários de drogas intravenosas, como cocaína e heroína. Além da pouca higiene na hora da administração, essas substâncias não são estéreis. O resultado final é a administração de quantidades elevadas de bactérias diretamente na circulação sanguínea. Quanto maior for o número de bactérias circulantes, maior é o risco de endocardite.
Normalmente, a endocardite em usuários de drogas IV é causada pela bactéria Staphylococcus aureus.
b) Doença valvar prévia
Pacientes com lesões das válvulas cardíacas, sejam adquiridas ou congênitas (de nascença), também são um grupo de alto risco.
Em geral, pacientes com lesões das válvulas cardíacas provocadas por quadro anterior de febre reumática são aqueles com maior risco (leia: FEBRE REUMÁTICA | Sintomas e tratamento). Porém, outros alterações valvulares, tais como estenose aórtica ou mitral, defeitos congênitos, como tetralogia de Fallot, coarctação de aorta ou defeitos no septo ventricular também são importantes fatores de risco.
Até o prolapso da válvula mitral, se acompanhado de insuficiência mitral, pode ser um fator de risco para endocardite (leia: PROLAPSO DA VÁLVULA MITRAL).
c) Válvulas cardíacas artificiais
Todo paciente com uma válvula cardíaca artificial está sob maior risco de desenvolver endocardite. As bactérias têm maior facilidade em aderir a produtos artificiais do que às válvulas nativas. O risco é consideravelmente maior no primeiro ano após a troca das válvulas.
d) Endocardite de Libman-Sacks
A endocardite de Libman-Sacks é uma tipo raro de endocardite, de origem não infecciosa, isto é, que não causada por nenhum germe, que surge nos pacientes com uma doença chamada lúpus eritematoso sistêmico (leia: LÚPUS ERITEMATOSO SISTÊMICO | Sintomas e tratamento).
SINTOMAS DA ENDOCARDITE BACTERIANA
O quadro clínico da endocardite bacteriana é muito variável, podendo o paciente apresentar desde sepse grave e insuficiência cardíaca aguda, até quadros mais arrastados de febre de origem obscura, como nos casos das endocardites subagudas.
Os sintomas mais comuns da endocardite são febre e calafrios. Na endocardite subaguda, outros sintomas inespecíficos são comuns, como falta de ar, cansaço, perda do apetite, dores pelo corpo, suores noturnos, etc.
Nos quadros graves de endocardite aguda, a febre e os calafrios são intensos e o paciente rapidamente evoluiu com sinais de insuficiência cardíaca, com intensa falta de ar, incapacidade de ficar deitado e edemas nas pernas.
A história clínica, que nos ajuda a identificar os fatores de risco, associado a um quadro de febre sem causa aparente, calafrios, queda do estado geral, surgimento de sopro cardíaco (leia: SOPRO NO CORAÇÃO | Causas, sintomas e tratamento) e sinais de embolização periférica, costumam sugerir o diagnóstico de endocardite.
DIAGNÓSTICO DA ENDOCARDITE BACTERIANA
O diagnóstico é geralmente confirmado através do ecocardiograma, que é um exame capaz de identificar a presença de vegetações em uma das válvulas do coração. O ecocardiograma habitual, chamado de transtorácico, pode ser usado inicialmente, mas ele não é melhor método para o diagnóstico da endocardite. Algumas vegetações menores podem passar despercebidas nesta forma. O exame mais indicado é ecocardiograma transesofágico, que é feito por via endoscópica. Esta é a modalidade de ecocardiograma que apresenta as melhores imagens das válvulas do coração.
O tipo de bactéria que está provocando a endocardite é diagnosticado através da hemocultura, que é um exame de sangue que identifica a presença de bactérias circulando na corrente sanguínea.
TRATAMENTO DA ENDOCARDITE
O tratamento da endocardite é feito obrigatoriamente com antibiótico por via venosa, que devem ser administrados por, no mínimo, quatro semanas. A escolha do antibiótico adequado depende do tipo de bactéria que está alojada nas válvulas.
Nos casos mais graves, quando há destruição da válvula cardíaca pela infecção, uma cirurgia de troca valvar é necessária, com implantação de uma válvula artificial.
PROFILAXIA DA ENDOCARDITE
Nos indivíduos sob alto risco de desenvolver endocardite, como explicado mais acima, é indicado o uso profilático de antibióticos antes de procedimentos que possam predispor a bacteremias.
Em geral, indica-se um dose única de 2 gramas de amoxicilina ou 500 mg de azitromicina 1 hora antes de procedimentos dentários ou respiratórios.
Segundo o mais recente guideline da American Heart Association, atualizado em 2007, apenas os seguintes pacientes devem fazer profilaxia:
– Portadores de válvulas artificiais.
– Pacientes com história prévia de endocardite.
– Doença valvar em transplantados cardíacos.
– Pacientes com doenças cardíacas congênitas.
– Pacientes com história prévia de endocardite.
– Doença valvar em transplantados cardíacos.
– Pacientes com doenças cardíacas congênitas.
Nem todos os fatores de risco são graves o suficiente para se indicar profilaxia. Prolapso de válvula mitral, mesmo com sinais de regurgitação, e lesões simples das válvulas, como estenoses e regurgitações, por exemplo, não são indicações para uso de antibiótico profilático.
Quais são os procedimentos de risco?
– Procedimentos dentários com manipulação de gengiva, mucosa oral ou região periapical dos dentes.
– Procedimentos respiratórios que envolvam incisão ou biópsia, como broncoscopia com biópsia, remoção de amígdalas ou adenoides.
– Procedimentos respiratórios que envolvam incisão ou biópsia, como broncoscopia com biópsia, remoção de amígdalas ou adenoides.
Procedimentos gástricos e urinários, como endoscopia, colonoscopia, colocação de cateteres duplo J, biópsia ou cirurgia de próstata não são procedimentos de risco para endocardite.
Sexo anal é fator de risco para endocardite?
Não, sexo anal não provoca endocardite. Isso é apenas um dos muitos mitos espalhados pela Internet. Não há nenhum estudo científico que tenha comprovado qualquer relação direta entre qualquer tipo de sexo e a endocardite.
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